terça-feira, 13 de dezembro de 2016

Capítulo II - Maldito Seja! (O Flagelo de Dernessus)

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Domo do Rei,
Castelo da Ordem
3ª aurora após a 2ª lua plena do inverno, ano 454 após a Unificação


O frio corredor parecia longo demais. Os passos eram apressados, porém a sensação era como se estivessem se arrastando; como se seus pés estivessem presos a uma corrente ligada a um pesado globo de ferro.
Tudo parecia muito lento.

Há muitos verões o povo de Sieghard aguardava o que ele acabara de testemunhar, e a informação que trazia consigo. Para aquele que carregava a mensagem, um nobre, porém, ela poderia se tornar um destino duro de suportar. Enquanto avançava em um caminhar veloz e silencioso, um choro infantil inundava o corredor e reverberava nas paredes de pedra, chegando aos ouvidos como um grito de alívio e consolação para os moradores do Castelo da Ordem.

A escada até os pavilhões superiores do castelo nunca fora tão difícil de atravessar. Sua aparência claustrofóbica assemelhava-se mais a um túnel por debaixo de alguma montanha das Terras de Além-Escarpas. A subida era extrema, e os degraus serviriam apenas para trolls, de tão altos. Como nunca havia reparado neles?

Seu formato em caracol enganava ainda mais.

A ansiedade aumentava à medida que mais degraus eram superados, e um labirinto em espiral, infinito em sua extensão, brotava perante seus olhos. O suor frio escorria pelas costas e gelava a espinha. Apenas mais um pouco desta eternidade e sua missão seria cumprida.

No entanto, essa era apenas a sua sensação, que tornava a imaginação a própria continuidade dela.

Enfim, a porta dupla surgiu diante dele em completo esplendor. Ornamentada com desenhos em alto relevo esculpidos em uma chapa de aurumnigro, o metal mais precioso do reino, ela contrastava com o ambiente simples e frio à sua volta. Por detrás dela, uma câmara que poucos haviam visto em todo Sieghard. A partir deste ponto, todo grande homem se tornava pequeno. Chegará uma aurora em que tudo isto será meu, pensou o portador da mensagem. Afixada no magistral artefato artístico, uma aldrava escura e brilhante se dependurava.

Três batidas metálicas firmes e fortes soaram.

— Vida longa a Marcus e à plenitude da Ordem — saudou em voz alta.

A porta foi aberta para ele por um dos criados, que imediatamente o levou até o próximo aposento, como se já o aguardassem.

Dentro do cômodo, um senhor alto e imponente, de ricos trajes, se postava de pé, trazendo em seu semblante uma profunda preocupação, como se sua vida dependesse da mensagem trazida. Com a mão no queixo, meditava sobre recordações de décadas passadas quando conseguira assumir o trono. Atrás dele, mapas de diversas províncias do reino jaziam pendurados nas paredes, alguns sobre uma cama com lençol bordado em ouro e pedras reluzentes, outros sobre uma escrivaninha forjada em aurumnigro. Também uma gama de objetos valiosos se encontrava ali: armaduras, cestos de papiros, uma flâmula estampada com o símbolo da Ordem, o rubro meio sol nascente, e outra com o símbolo da família Marcus, o leão rampante. O quarto era complementado com pinturas dos mais importantes artistas alodianos, que adornavam o teto e transformavam-no em uma obra de arte. Por fim, as compridas janelas verticais, localizadas uma em cada parede, mostravam não só toda a vastidão do Planalto Real como também o Obelisco de Alódia, pequenino em sua lonjura, vigiando o horizonte como um guardião perfeito.

Junto ao velho senhor, sentado na ponta da cama, encontrava-se um homem jovem e vigoroso, que teria pouco mais do que vinte verões de idade. Olhando a janela de longe, ele parecia perdido em pensamentos. Ambos, o velho e o jovem, possuíam porte e aparência física similar: nariz afilado e reto, de rostos angulados, e finos cabelos castanhos, pouco volumosos e curtos. A diferença estava na cor de seus olhos: enquanto o jovem apresentava olhos cor de mel, os do velho resplandeciam uma cor azul tranquila e pacífica, embora desgastada pelo tempo.

De súbito, todas as atenções se viraram para o recém-chegado, preparados para a informação que tanto queriam ouvir desde o início da manhã. Nenhuma pergunta foi feita. A resposta era já esperada.

— É chegado o seu neto, vossa majestade. Pela Ordem e pela glória de Sieghard! — olhando para o velho senhor, o mensageiro disparou.

— Louvados sejam os deuses — disse o rei em voz baixa. — Obrigado, Sir Maya — agradeceu ao mensageiro.

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