sexta-feira, 18 de maio de 2018

Mundos Fantásticos: Como escrever fantasia



Por L.P.Faustini
Texto base para VII Bienal Rubem Braga

Afinal, como escrever fantasia? Como criar um mundo fantástico? Ou melhor, como imaginar um mundo fantástico? As crianças fazem isso diariamente. E sabem o porque? Simplesmente porque elas não viram o bastante, não experimentaram o bastante e não compreendem a mecânica do mundo real ainda. Cada vez mais que algo se torna comum, menos fantástico ele se torna. E o que torna qualquer coisa fantástica é o ineditismo, seja de uma ação, seja de uma visão. Mesmo para nós, adultos, quando nos deparamos com uma paisagem que nunca vimos antes, que nos cativa, uma nova tecnologia,  ou um animal que nem os livros da escola nos mostraram, a primeira coisa que fazemos é deixar cair o queixo e pensar: isso é fantástico!

Na mente de uma criança há muitos mundos fantásticos

Partindo desta afirmação – de que o fantástico é algo inédito e surpreendente, inventado ou não, existente ou não – então você já possui um ponto de partida para criar o seu universo: criar algo inédito e surpreendente. Mas não pense que é tão fácil assim. Ao contrário do mundo imaginado pela criança, a fantasia formal (como podemos apelidar) ela tem, sim, a sua mecânica de mundo. E para que possamos pensar em uma mecânica fantástica, temos que, pelo menos, entender um pouco sobre o mundo real e suas relações políticas, sociais, religiosas, geográficas e econômicas.

Vejamos por exemplo, em O Senhor dos Anéis, Tolkien nos apresenta raças (elfos, anões, humanos, orcs, etc), cada uma delas inserida em uma cultura, com costumes e valores éticos e morais diferentes, e ainda assim, relacionadas entre si através de um histórico de alianças politicas, econômicas, guerras e atos de heroismo. Tolkien não fez isso deliberadamente, ele sabia que precisava fazer isso, porque mesmo que o universo seja fantástico, ele precisava ser crível. E é isso (além do enredo) que difere uma boa fantasia de uma fantasia ruim.

Culturas diferentes e alianças políticas

No momento que começamos a escrever a nossa trama fantástica, precisamos que o leitor entenda o contexto que se passa naquele mundo. Todos nós, como indivíduos, estamos inseridos em um contexto, seja ele local, regional ou global; micro ou macro. Com os protagonistas de sua história, não é diferente. Há autores que passam este contexto de uma vez só, de modo geral em um prólogo, e há outros que o passam paulatinamente com o desenrolar da trama.

No caso da saga que escrevo, Maretenebrae, um rei acaba de assumir o trono depois de um período regencial de 20 anos, instaurado logo após o rei anterior ter desaparecido sob suspeita de conspiração. Esse é o contexto político local. Há pessoas que acreditam que o antigo rei morreu, outros acreditam que ele ainda está vivo. E desse contexto, podemos daí aproveitar muitas outras boas histórias que podem, inclusive, correr em paralelo à trama principal do meu livro, que é a luta de 7 pessoas pela sobrevivência e sua busca pela salvação de Sieghard, um reino invadido e dominado pelas forças do Caos.

As forças do Caos atacam Sieghard, como os mouros atacaram Portugal

“Ah, mas meu enredo é tão clichê!” – disse o aspirante a escritor.

Mas dependendo de forma como você desenvolver a sua história, o clichê pode até passar batido e ser ignorado.

Vejamos um exemplo: “Um líder conquistador chega em terras desconhecidas com sua tripulação em busca de metais preciosos, minerais e madeira. Lá, ele encontra uma tribo que oferece resistência ao intuitos dos conquistadores. Tentando convencer os nativos a ceder, o líder conhece uma nativa e acaba se apaixonando por ela. No final, ele luta contra seu próprio povo para salvar a tribo”. Não parece o enredo de Pocahontas, sucesso de bilheteria da Disney? Mas também parece Avatar, que também foi sucesso de bilheteria 14 anos depois com A MESMA HISTÓRIA! (e eu ainda poderia citar outros filmes de sucesso que usaram deste mesmo enredo).

Afinal, o que mudou?


O universo que James Cameron criou para Avatar é fora da curva, é excepcional. E a filmagem em Real 3D, do modo como foi feita, revolucionou o cinema.

Pocahontas e Avatar, mesma história, visões diferentes

Portanto, não se preocupe tanto se seu enredo é clichê. Há preocupações maiores. Se preocupe na forma de contar sua história. Aprofunde a construção do seu mundo, seus personagens (dê boas personalidades a eles). Conquiste o leitor com seu modo de escrever, faça com que se importem com seus protagonistas. Faça o seu “Real 3D” funcionar, como James Cameron fez em cima de uma trama mais que batida.

A verdade mesmo é que não existe uma receita de bolo certa para o sucesso do seu livro, caso contrário, eu estaria vivendo da venda dos meus (rs). Mas nem tudo é venda e lucro, não é? É certo que queremos que nossas histórias sejam lidas, refletidas, discutidas. Escrevemos pelo simples prazer de escrever. Porém, a fantasia é um exercício de imaginação com mecânicas reais. É sério! Afinal, se não somos capazes de acreditar nem nas nossas próprias histórias, quem dirá o leitor!

Agora, prepare o lápis ou os dedos, e comece a sua!

1 comentários:

Daniel Aguiar disse...

Show de bola, amigo. Bem interessante o texto. Ansioso pela continuação da saga.